E nós? Seremos mais Europeus ou mais Italianos?
Think about it...
Wednesday, 25 July 2007
Tuesday, 24 July 2007
Saturday, 21 July 2007
As fontes
Um dia quebrarei todas as pontes
Que ligam o meu ser vivo e total,
À agitação do mundo irreal,
E calma subirei até às fontes.
Irei até às fontes onde mora
A plenitude, o límpido esplendor
Que me foi prometido em cada hora,
E na face incompleta do amor.
Irei beber a luz e o amanhecer
Irei beber a voz dessa promessa
Que às vezes como um voo me atravessa,
E nela cumprirei todo o meu ser.
Think about it...
Friday, 20 July 2007
Série Pessoa - Fernando Pessoa (ortónimo)
(óleo sobre tela, 1889)
Ela canta, pobre ceifeira,
Julgando-se feliz talvez;
Canta, e ceifa, e a sua voz, cheia
De alegre e anónima viuvez,
Ondula como um canto de ave
No ar limpo como um limiar,
E há curvas no enredo suave
Do som que ela tem a cantar.
Ouvi-la alegra e entristece,
Na sua voz há o campo e a lida,
E canta como se tivesse
Mais razões pra cantar que a vida.
Ah, canta, canta sem razão !
O que em mim sente 'stá pensando.
Derrama no meu coração a tua incerta voz ondeando !
Ah, poder ser tu, sendo eu !
Ter a tua alegre inconsciência,
E a consciência disso !
Ó céu ! Ó campo ! Ó canção ! A ciência
Pesa tanto e a vida é tão breve !
Entrai por mim dentro ! Tornai
Minha alma a vossa sombra leve !
Depois, levando-me, passai !
Fernando Pessoa (1914)
Think about it...
"Sexa", ou os perigos da Linguística!
-Pai...
-Hmmm?
-Como é o feminino de sexo?
-O quê?
-O feminino de sexo.
-Não tem.
-Sexo não tem feminino?
-Não.
-Só tem sexo masculino?
-É. Quer dizer, não. Existem dois sexos. Masculino e feminino.
-E como é o feminino de sexo?
-Não tem feminino. Sexo é sempre masculino.
-Mas você mesmo disse que tem sexo masculino e feminino.
-O sexo pode ser masculino ou feminino. A palavra "sexo" é masculina. O sexo masculino, o sexo feminino.
-Não devia ser "a sexa"?
-Não.
-Porque não?
-Porque não! Desculpe. Porque não. "Sexo" é sempre masculino.
-O sexo da mulher é masculino?
-É. Não! O sexo da mulher é feminino.
-E como é o feminino?
-Sexo mesmo. Igual ao do homem.
-O sexo da mulher é igual ao do homem?
-É. Quer dizer... Olha aqui. Tem o sexo masculino e o sexo feminino, certo?
-Certo.
-São duas coisas diferentes.
-Então como é o feminino de sexo?
-É igual ao masculino.
-Mas não são diferentes?
-Não. Ou, são! Mas a palavra é a mesma. Muda o sexo, não muda a palavra.
-Mas então não muda o sexo. É sempre masculino.
-A palavra é masculina.
-Não. "A palavra" é feminino. Se fosse masculina seria "o pal..."
-Chega! Vai brincar, vai.
O garoto sai e a mãe entra. O pai comenta:
-Temos que ficar de olho nesse guri...
-Por quê?
-Ele só pensa em gramática.
-Hmmm?
-Como é o feminino de sexo?
-O quê?
-O feminino de sexo.
-Não tem.
-Sexo não tem feminino?
-Não.
-Só tem sexo masculino?
-É. Quer dizer, não. Existem dois sexos. Masculino e feminino.
-E como é o feminino de sexo?
-Não tem feminino. Sexo é sempre masculino.
-Mas você mesmo disse que tem sexo masculino e feminino.
-O sexo pode ser masculino ou feminino. A palavra "sexo" é masculina. O sexo masculino, o sexo feminino.
-Não devia ser "a sexa"?
-Não.
-Porque não?
-Porque não! Desculpe. Porque não. "Sexo" é sempre masculino.
-O sexo da mulher é masculino?
-É. Não! O sexo da mulher é feminino.
-E como é o feminino?
-Sexo mesmo. Igual ao do homem.
-O sexo da mulher é igual ao do homem?
-É. Quer dizer... Olha aqui. Tem o sexo masculino e o sexo feminino, certo?
-Certo.
-São duas coisas diferentes.
-Então como é o feminino de sexo?
-É igual ao masculino.
-Mas não são diferentes?
-Não. Ou, são! Mas a palavra é a mesma. Muda o sexo, não muda a palavra.
-Mas então não muda o sexo. É sempre masculino.
-A palavra é masculina.
-Não. "A palavra" é feminino. Se fosse masculina seria "o pal..."
-Chega! Vai brincar, vai.
O garoto sai e a mãe entra. O pai comenta:
-Temos que ficar de olho nesse guri...
-Por quê?
-Ele só pensa em gramática.
Luís Fernando Veríssimo, Comédias para se ler na escola.
Think about it... :)
Thursday, 19 July 2007
Série Pessoa - Alberto Caeiro
(óleo sobre tela)
X
«OLÁ, GUARDADOR de rebanhos,
Aí à beira da estrada,
Que te diz o vento que passa?»
«Que é vento, e que passa,
E que já passou antes,
E que passará depois.
E a ti o que te diz?»
E que já passou antes,
E que passará depois.
E a ti o que te diz?»
«Muita cousa mais do que isso.
Fala-me de muitas outras cousas.
De memória e de saudades
E de cousas que nunca foram.»
«Nunca ouviste passar o vento.
O vento só fala do vento.
O que lhe ouviste foi mentira,
E a mentira está em ti.»
Alberto Caeiro, O Guardador de Rebanhos (1911-12)
Think about it...
Série Pessoa - Álvaro de Campos
(óleo, têmpera e pastel em cartão)
Lisbon Revisited
NÃO: Não quero nada.
Já disse que não quero nada.
Não me venham com conclusões!
A única conclusão é morrer.
Não me tragam estéticas!
Não me falem em moral!
Tirem-me daqui a metafísica!
Não me apregoem sistemas completos, não me enfileirem conquistas
Das ciências (das ciências, Deus meu, das ciências!) —
Das ciências, das artes, da civilização moderna!
Que mal fiz eu aos deuses todos?
Se têm a verdade, guardem-na!
Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro da técnica.
Fora disso sou doido, com todo o direito a sê-lo.
Com todo o direito a sê-lo, ouviram?
Não me macem, por amor de Deus!
Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?
Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa?
Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.
Assim, como sou, tenham paciência!
Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que havemos de ir juntos?
Não me peguem no braço!
Não gosto que me peguem no braço. Quero ser sozinho.
Já disse que sou sozinho!
Ah, que maçada quererem que eu seja da companhia
Ó céu azul — o mesmo da minha infância —
Eterna verdade vazia e perfeita!
Ó macio Tejo ancestral e mudo,
Pequena verdade onde o céu se reflete!
Ó mágoa revisitada, Lisboa de outrora de hoje!
Nada me dais, nada me tirais, nada sois que eu me sinta.
Deixem-me em paz! Não tardo, que eu nunca tardo...
E enquanto tarda o Abismo e o Silêncio quero estar sozinho!
Álvaro de Campos (1923)
Think about it...
Wednesday, 18 July 2007
Tuesday, 17 July 2007
Série Pessoa - Bernardo Soares
(óleo sobre tela)
"Pasmo sempre quando acabo qualquer coisa. Pasmo e desolo-me. O meu instinto de perfeição deveria inibir-me de acabar; deveria inibir-me até de dar começo. Mas distraio-me e faço. O que consigo é um produto, em mim, não de uma aplicação de vontade, mas de uma cedência dela. Começo porque não tenho força para pensar; acabo porque não tenho alma para suspender. Este livro é a minha cobardia."
Bernardo Soares, O Livro do Desassossego, trecho 152.
Com estas palavras de Bernardo Soares, dou início àquela a que decidi chamar a "Série Pessoa", que integrará alguns dos meus (muitos) trechos preferidos da obra de Fernando Pessoa e seus heterónimos. Pessoa é sempre um bom ponto de partida para momentos de reflexão e introspecção, portanto...
... think about it...
Wednesday, 11 July 2007
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